Nepal – Um lugar de Paz e Espiritualidade

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Minha viagem ao Nepal teve início com uma imersão de 7 dias nas montanhas de Nagarkot, uma seleção incrível de 56 educadores para paz de vários lugares do mundo foram reunidos pelo International Institute on Peace Education para trocar experiências e difundir as práticas deste campo da educação. Há outro artigo onde abordo este encontro e como foi a experiência de minha participação, também a apresentação do projeto realizado pela equipe do Coletivo cultural Fora da Caixa. Vide link: https://www.foradacaixacoletivo.com.br/openzine/iipe-nepal-uma-experiencia-extraordinaria/

Esta narrativa corresponde ao período pós-evento, onde tive a oportunidade de perambular e peregrinar em locais sagrados da cidade, Vale de Catmandu e redondezas. As orientações, dicas para onde ficar, a indicação dos guias e serviços de transporte me foram passadas por meu amigo de longa data Manoel Morgado, montanhista experiente e especialista em levar grupos para escaladas no Everest, Kilimanjaro e muitas outras montanhas no mundo todo. Devido ao seu trabalho e opção de vida, ele já morou em Catmandu, conhece este destino como o quintal de sua casa. Suas indicações foram preciosas e tornou minha viagem muito mais tranquila e segura. Conheça a programação de seus grupos e viagens em Morgado Expedições. Vide link: https://www.morgadoexpedicoes.com.br/

Eu adoro viajar solo, decidir como e onde vou passar meus dias ou simplesmente sentar em algum café e ver a vida passar, sentir a atmosfera do local sem ter nada planejado previamente.

Fiquei hospedada ao lado do Mosteiro Budista Shechen, sentindo de perto as boas vibrações deste local lindo, sagrado e inspirador. Ali eles mantêm uma hospedaria muito organizada, limpa e com uma cafeteria que servia várias coisas deliciosas e com um preço super acessível. Aliás, viajar para o Nepal não é caro, a pior parte é a passagem, mas em termos de estadia e alimentação é bem tranquilo. Apenas um detalhe: é super importante levar dinheiro (Dólares) em espécie, são poucos os lugares que aceitam cartões de crédito e débito internacional. Isso atrapalhou um pouco minha estadia em alguns momentos mas graças a ajuda de meus anjos da guarda Gunjan Jha e Yoo Gesh, amigos que se tornaram meus salvadores em alguns perrengues por conta de meu cartão de débito internacional  não ter funcionado para sacar dinheiro, com a ajuda deles ficou tudo bem e pude aproveitar ao máximo os dias que estive na cidade.

A localização da hospedaria não poderia ser melhor, afastada um pouco da muvuca do centro e bem perto da stupa de Boudhanath, um dos locais mais procurados pelos peregrinos e turistas em Catmandu. O local é realmente especial, repleto de devotos fazendo suas preces, prostrações e se nutrindo daquela energia espiritual que emana deste local sagrado.

Saindo da hospedaria, caminhando por algumas vielas, logo se avistava a stupa.

Mas antes de chegar era preciso atravessar o pátio do monastério que por si só já era encantador. Me senti muito privilegiada e protegida em estar ali. Uma das razões de minha viagem era peregrinar em locais budistas que tem uma conexão com minha prática e estudos de Medicina Tibetana, então estar ali já despertava em mim um sentimento profundo de gratidão e devoção. O monastério e o templo são muito lindos, cheio de detalhes em suas pinturas, rodas de oração, símbolos auspiciosos, janelas e portas coloridas, jardins floridos e cheios de vida.

A hospedaria também era acolhedora, com um atendimento excelente, pessoas gentis e educadas. já mencionei o cardápio, né? Mas vou mostrar algumas imagens:

Confesso que não senti o tempo passar no período que estive no Nepal, parecia que eu estava vivendo uma realidade paralela, a hospitalidade, harmonia, o respeito entre as pessoas, a educação e a simplicidade me fizeram sentir uma paz interior e exterior que em poucos momentos ou locais do mundo pude experimentar. Ao perguntar para os moradores locais ou não, qual era sua religião, a resposta era sempre a mesma:

 “Sou budista e hinduísta, aqui todos respeitam e vivem em harmonia com todas as religiões”. Simples assim.

Estar longe de nossa sociedade que insiste em evangelizar e condenar religiões que são muito mais antigas que o cristianismo, muito mais inclusivas, pacíficas em suas práticas e menos preconceituosas, me fez refletir sobre a pobreza espiritual que tem se instalado em nosso país. Pobreza sim, pois os ensinamentos de todas as religiões, oriundas de qualquer país ou tempo, pregam o amor, a compaixão e a bondade. Mas esses valores não me parecem estar sendo cultivados atualmente. Isso me entristece, mas ao mesmo tempo estar no Nepal e sentir essa união verdadeira, vibrante e fortemente espiritual me deu esperança de que um dia o mundo possa se inspirar com este exemplo e evoluir a ponto de alcançar essa excelência em termos de seres humanos espiritualizados.

O comércio local é predominantemente devocional, vendedores de sementes, frutas, especiarias misturados nas vielas com souvenirs, incensos, japamalas, Tankas, imagens de Budas, Yoginis, Divindades do HInduísmo e muita variedade de artefatos religiosos. Não há pessoas insistindo para você comprar nada, no máximo eles convidam você para entrar na sua loja ou mostram seus produtos e com um simples “No, thanks” eles se vão e te deixam andar sem ser importunada.

Por pura ignorância e desconhecimento eu imaginava que as pessoas seriam mais insistentes, como na Índia por exemplo, onde é muito difícil visitar locais turísticos sem que haja vários vendedores, crianças e mendicantes tentando atrair sua atenção. Assim como pensei que o trânsito seria similar, com muita aglomeração, buzinas, animais e confusão. Me enganei outra vez, há um trânsito intenso sim mas sem animais e nem buzinas.

Não posso deixar de mencionar a limpeza dos locais, não vi lixo acumulado em nenhum lugar, muito menos nos locais de peregrinação ou sítios arqueológicos. Meu guia Narayan me explicou que o governo paga diretamente às pessoas que fazem a limpeza o valor adquirido com a venda de ingressos de entrada para visitantes. Assim os locais são varridos três vezes ao dia, mantendo uma aparência convidativa e agradável aos que estão em circulação nos locais.

Outro fato que não conhecia é que o Nepal nunca foi colonizado, a Inglaterra tentou invadir o país inúmeras vezes mas a valentia e a expertise dos nepaleses em lutar nas montanhas fez com que os ingleses desistissem de colonizá-los e após um tempo passou a contratar soldados nepaleses para lutar em suas guerras, inclusive na guerra da Ilhas Malvinas. Isso gerou um outro tipo de problema na sociedade nepalesa, que hoje possui em grande número de jovens que se alistam para lutar e morrer em guerras e conflitos que não estão ligados ao seu país.O Nepal é um país pacífico, orgulhoso de cultura e sua autonomia mas desde a Pandemia vem enfrentando problemas como a falta de empregos, empurrando seus jovens para o exército em busca de estabilidade, status e pensão vitalícia. É um problema social complexo mas enquanto a economia não se recuperar não há uma solução possível.

Um dos locais mais interessantes para se conhecer na cidade é a Praça Patan Durbar.  É uma das três praças de Durbar no Vale de Catmandu, todas elas inscritas na lista do Património Mundial da UNESCO. Uma das atrações é o antigo Palácio Real, onde os reis da Dinastia Malla residiram por algum tempo. Os três pátios principais do palácio são Chowk Mul, Sundari Chowk e Keshav Narayan Chowk. Além desses pátios, o complexo possui impressionantes templos, santuários religiosos e lugares históricos, mostrando as habilidades dos artistas e artesãos Neuaris ao longo de vários séculos da arquitetura Newari. O local foi quase totalmente destruído no terremoto de 2015 e ainda é possível ver algumas construções que estão sendo restauradas ou reconstruídas.

O comércio no local é muito interessante e cheio de artigos típicos, há uma grande variedade de ornamentos tanto para casa quanto acessórios como pulseiras, colares, anéis e artigos para decoração. Uma tentação para os visitantes, dá vontade de trazer tudo mas tive que me conter pois minha mala já estava quase cheia e pagar taxa extra por excesso de peso no aeroporto não é nada divertido. Além disso, eu tinha que reservar um espaço especial para algo que há muitos anos eu desejava comprar e que por sua beleza e utilidade terapêutica eu já tinha colocado na minha lista de desejos.

O museu abriga muitos artefatos, fotos e estelas, os jardins são muito bem cuidados e a maioria das esculturas estão em perfeito estado. No beiral dos telhados há sinos que tocam uma melodia suave e agradável, criando uma atmosfera meio mágica e musical para quem está de passagem. Estive por duas vezes neste local, a primeira com nosso grupo do IIPE que organizou um encontro no museu onde tivemos uma aula sobre a cultura e geografia do Nepal e tivemos uma apresentação de música tradicional nepalesa cantada e tocada por mulheres que conquistaram o direito de tocar instrumentos que antigamente eram tocados apenas por homens da comunidade. Nas duas vezes fiquei encantada com o local. Na segunda visita, meu guia Narayan, que é Doutor em História e Cultura, me explicou que sua tese de Doutorado foi sobre o impacto social que o terremoto teve no país. Com ele pude aprender mais detalhes sobre este evento trágico que marcou a vida de todos no país.

Este era um local de oração e devoção diária do Rei, ali ele reuniu os deuses e divindades de todos os templos e cultuava-os todos juntos. Como ele não teria tempo de visitá-los diariamente, construiu um altar coletivo onde podia cumprir sua devoção sem precisar sair do palácio. O fluxo da fonte que jorrava água ao centro foi interrompida devido aos efeitos do terremoto.

Como não se sentir atraída pelas tigelas cantantes tibetanas. Elas são feitas à mão, com metais preciosos, símbolos e mantras auspiciosos que são acionados em sua vibração através do som. Há muitas tigelas por aí mas estas são únicas, sua utilização é terapêutica e seu som harmoniza a vibração dos chakras e purifica o ambiente, é um som que cura a mente e o físico. Tive a alegria de conhecer um dos fabricantes que pertence a quinta geração de artesãos brâmanes que estão criando essas peças consideradas sagradas. Claro que eu já tinha deixado um lugar reservado em minha bagagem para trazer uma dessas lindezas. Quem quiser conhecer os benefícios e terapias, equilibrar suas energias poderá conhecê-las em meu consultório e marcar uma sessão terapêutica de sound healing integrada à Medicina Tibetana.

São muitas informações e sentimentos envolvidos quando visitamos locais com tanta história. Sempre me vem à mente os ensinamentos sobre a impermanência ao visitar palácios onde viveram reis e rainhas e que hoje são museus. A energia deles ainda pode ser sentida nos locais pois estão impregnadas em suas obras, o respeito que seus súditos tiveram pelo rei que era generoso e cuidava com zelo de seu povo também é mencionado. No palácio a janela de seu quarto permanece aberta, seu cachimbo é deixado no mesmo local de costume para que se um dia ele voltar, como prometeu, encontre tudo arrumado do jeito que ele gostava.

As imagens das ruínas após o terremoto também impressionam, foi realmente uma tristeza essa tragédia. Mas a reconstrução já está bastante avançada e as obras seguem seu curso para que tudo fique lindo e perfeito novamente.

Estamos aqui meramente de passagem, deixamos marcas boas e ruins, às vezes nem isso, o tempo e o esquecimento se estabelecem e não somos lembrados ou celebrados. Fico a pensar que enquanto vivos temos que cuidar de nossas ações, para que um dia alguém se lembre de nosso legado com alegria, pelas pessoas que ajudamos, pelas pontes que construímos e a generosidade que tivemos. Não há sentido em viver apenas acumulando coisas, não poderemos usufruir delas quando passarmos para o outro lado, não somos faraós que enterravam seus tesouros na crença que que seriam úteis do lado de lá. Nosso maior tesouro está no aqui e agora, sendo sua melhor versão e agindo com o coração!

O Nepal me inspirou muito, a atmosfera do país propicia reflexões profundas, sinto que saí do Nepal mas o Nepal não saiu de mim.

Em outro artigo farei a narrativa sobre as amizades que fiz e os locais sagrados que peregrinei, vem mais lugares encantados por aí.

Namastê!

Regina Proença

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